Bahia de Todos os Fatos

...1910 - 1919...

Voluntários de alistam para a guerra

Governador:
Antônio Ferrão Moniz de Aragão
Presidente da Assembleia Geral:
Frederico Costa
Presidente do Tribunal de Justiça:
Bráulio Xavier da Silva Pereira

É criado o município de Barra do Mendes.
J.J. Seabra visita a Bahia, em agradecimento à solidariedade de seus correligionários pela reeleição do deputado federal Mário Hermes, filho do ex-presidente da República, Hermes da Fonseca, que compõe a bancada baiana, apesar de não ser baiano. O governo decreta ponto facultativo nas repartições públicas e mobiliza todo seu pessoal para a recepção.

A eleição para renovação da Câmara e do Senado do estado da Bahia, coincidentemente, ocorre no mesmo dia dos festejos do Bonfim. Poucos cidadãos deixam de ir à festa para cumprir com o dever cívico, apurando- se um número elevado de abstenções.

É publicado edital para alistamento de eleitores, que estabelece: “Podem se alistar eleitores os cidadãos brasileiros maiores de vinte e um anos, com exceção dos analfabetos, dos mendigos, dos praças que não forem alunos das escolas militares de ensino superior, e dos religiosos de ordens monásticas, companhias ou comunidades de qualquer denominação, sujeitos a votos de obediência, regra ou estatuto que importe renúncia da liberdade nacional”.

J.J. Seabra, único candidato à vaga do Senado Federal surgida com a morte do ex-governador José Marcelino, passa a ter como concorrente Severino Vieira, seu arqui-inimigo. J.J. Seabra é eleito e, no Senado, enfrenta Rui Barbosa constantemente, numa disputa acirrada por prestígio.

Rui Barbosa é citado pela imprensa como o único candidato à Presidência da República capaz de conciliar o norte com o sul, por ser um símbolo da pátria, por ser um nome nacional e, não, regional. Acredita-se na possibilidade de êxito de sua indicação, pois Minas e São Paulo não lhe são hostis; no entanto, ninguém levanta sua candidatura.

Os amigos de J.J. Seabra, na Bahia, cogitam da possibilidade de lançar seu nome entre os prováveis candidatos à Presidência da República, ou simplesmente a vice. Seabra começa a levar a sério a proposta.

As oligarquias de São Paulo e Minas Gerais lançam a candidatura do paulista Rodrigues Alves à Presidência da República e do mineiro Delfim Moreira a vice. Seabra manifesta apoio a essa chapa, adiando, assim, seu sonho de ocupar o mais elevado cargo federal.

As fábricas de calçados estabelecidas no estado enfrentam dificuldades para adquirir couro. O Diário da Bahia chega mesmo a afirmar que “estamos todos ameaçados de aderir à moda de andar descalços”. O couro produzido no estado da Bahia é exportado para um truste norte-americano que compra toda a produção, provocando não apenas a escassez da matéria-prima como também a elevação dos preços. A crise é decorrência da guerra, já que os Estados Unidos necessitam satisfazer seus grandes contratos de fornecimento de produtos às tropas beligerantes.

A Bahia enfrenta forte crise econômica no setor do cacau, seu principal produto de exportação. A Inglaterra, alegando falta de transporte, proíbe temporariamente a entrada do café e do cacau nos seus portos. A exportação desses produtos no primeiro ano da guerra aumentou consideravelmente, mas, no decorrer dos anos seguintes, apresenta acentuada redução, até chegar à proibição atual pela Inglaterra.

A guerra provoca a alta dos preços e redução drástica na importação de anilina, originária da Alemanha, obrigando-nos a encontrar novas soluções. A Bahia, então, passa a produzir anilina para tingir tecidos, em trinta e sete cores, em laboratório instalado no bairro de Itapagipe.

O presidente da República, por meio do ministro da Guerra, resolve impedir a saída à noite de qualquer navio nacional ou estrangeiro dos portos brasileiros, em decorrência de um combate naval travado a 30/40 milhas da ilha de Fernando de Noronha, entre cruzadores e couraçados alemães e os navios de guerra ingleses Glasgow e Amethyst. O ministro da Guerra recomenda que as fortificações e as guarnições sejam reforçadas e postas de prontidão no Porto de Salvador.

O povo baiano sai às ruas em manifestação patriótica de apoio e solidariedade à decisão do presidente da República, Wenceslau Braz, de romper relações diplomáticas com a Alemanha, em atitude de desagravo contra o torpedeamento do paquete Paraná, no Canal da Mancha, por um submarino alemão.

O governo brasileiro ordena o alistamento de homens para a armada nacional. Em Salvador, trezentos voluntários se apresentam, entre eles o governador do estado, Antônio Moniz, e o dr. Miguel Calmon, cuja atitude é considerada como exemplo de civismo e lição à juventude brasileira.

A Bahia confisca navios alemães, cuja tripulação fica instalada em São Lázaro, em Salvador, causando pânico à vizinhança. Os marinheiros alemães passam necessidades; alguns se encontram com febre, sem assistência.

Recomeça a exploração das minas de manganês no município de Bonfim, aumentando as exportações para França, Portugal e Estados Unidos. Cresce a pesquisa por novas minas em todo o estado, e ocorrem descobertas em Porto Seguro e Santo Antônio de Jesus.

Com o rompimento das relações diplomáticas do governo brasileiro com a Alemanha, as fábricas de charutos de São Félix e Cachoeira são fechadas, sob a acusação de pertencerem ao governo alemão, deixando 3.000 operários desempregados. Após comprovação pelos proprietários, por meio de prova documental, de que as mesmas são brasileiras, o ministro da Fazenda expede instruções reservadas, autorizando a reabertura das fábricas com algumas ressalvas.

No Rio de Janeiro, ocorre manifestação na avenida Rio Branco, em homenagem a Rui Barbosa, na qual é calculada a presença de cerca de 20 mil pessoas. Em seu discurso, o conselheiro protesta contra a conflagração europeia, afirmando ser a guerra atual a luta do direito contra a força, e que o Brasil errou em não ter se manifestado logo no princípio contra a violação do Pacto de Haia.

A polícia age preventivamente, fazendo rigoroso policiamento nas ruas do Comércio, em Salvador, devido a boatos de assaltos a casas comerciais de alemães.

O governo do estado, conforme resolução do Tribunal de Contas, decreta a suspensão de verbas para o município de Mundo Novo. A acusação é de desvio das verbas destinadas à educação.

Os empregados dos bondes da Linha Municipal fazem comunicado à população baiana de que paralisarão as atividades, caso não recebam os salários em atraso.

Volta a circular o Jornal de Notícias. Simões Filho, diretor do jornal Tarde, assume a responsabilidade, organizando uma sociedade anônima para continuar a sua publicação.

Chegam a Salvador, depois de viajar dezoito dias a pé, desde as margens do São Francisco, três ingênuos silvícolas, que se dirigem ao Rio de Janeiro. Solicitam do governador do estado as passagens, para seguirem destino. Levam em seu poder uma representação assinada por 180 companheiros, por meio da qual reivindicam a devolução de terras invadidas desde o descobrimento do Brasil.

Começam os trabalhos de extração do manganês entre os municípiosde Nazaré e Santo Antônio de Jesus.

No horto da Estação Experimental Agrícola do município de Juazeiro, já se produzem nove variedades de algodão, apesar de o terreno não ser dos melhores.

A cidade de Salvador está entregue ao total descaso, com a imprensa criticando a falta de cuidado com as ruas, além do desaparecimento dos casarios residenciais das primeiras autoridades temporais e eclesiásticas.

“Tudo passa, o tempo passa
Passam cobras e chacais.
Mas tu ficas… que desgraça!
– Só tu, Pacheco, não sais!”
“Um dia o Rio das Tripas,
Talvez tenha outros canais;
Nem pelas tripas de Judas
– Só tu, Pacheco, não sais!
“Saem tatus dos buracos
E dos covis, os chacais.
Mas do município em cacos,
– Só tu, Pacheco, não sais!”
“Dos tribunais saem contas
De intendentes imorais,
Com cifras bailando às tontas.
– Só tu, Pacheco, não sais!”

(Anônimo. Trovas publicadas no jornal A Tarde, pedindo a saída
do intendente de Salvador)

O serviço de água não funciona, o serviço da Linha Circular é muito irregular, a coleta de lixo não existe.

A crise financeira ameaça a realização do Carnaval. A imprensa procura estimular a população, com chamadas do tipo “tristeza não paga dívida”, ou “durante os três dias de Momo saiam às ruas alegremente”. O Politeama se prepara com pompas para o baile a fantasia. O tema preferido da festa é o intendente Pacheco Mendes:

P-a-Pa-c-h-e-chê-c-o-co,
Natural do Ceará
Na vazante da maré
Sua urucubaca vai botá.

O intendente ordena que a seção de águas retire o chafariz existente no Largo da Conceição da Praia, causando indignação à população daquele distrito, que não tem como se abastecer de água.

A carestia do pão e da carne verde torna-se insuportável, levando o povo a reagir com protestos violentos, saqueando o comércio e acusando o governo de não tomar medidas enérgicas para controlar a crise. O intendente Pacheco Mendes é demitido do cargo, assumindo-o interinamente Otaviano Pimenta.

O governo, na tentativa de controlar a crise, baixa os preços dos gêneros de primeira necessidade, mas isso de pouco adianta. Faz-se necessário regularizar a vida financeira do estado, pois os funcionários públicos estaduais e municipais chegam a ter atrasados os seus vencimentos por mais de um ano.

É instalada com solenidade, no Instituto Histórico, a Liga de Defesa Nacional, confederada à liga central, no Rio de Janeiro.

É fundada a Academia de Letras da Bahia. Entre os patronos das cadeiras constam os nomes de Gregório de Matos, Castro Alves e Francisco Mangabeira. Dos imortais, dezesseis são médicos, quinze bacharéis, quatro engenheiros, três alunos-mestres, um padre e dois sem título.

O deputado carioca Maurício de Lacerda apresenta na Câmara Federal um projeto alterando a lei eleitoral, objetivando estender o direito de voto às mulheres. O jornal A Tarde procura ouvir as senhoras e senhorinhas baianas a respeito, promovendo uma enquete com as perguntas: “A mulher deve influir na vida política do país, aumentando-lhe mais os encargos de mãe de família?” “Deve à mulher ser conferido o direito de voto?”. Algumas respostas: “A mulher deve ser unicamente a rainha do lar, limitando-se a sua missão ao desvelo e carinho pelo esposo e filhos (…) desviá-la desse papel é interromper a ordem, a harmonia estabelecida pela providência (..) ela não está preparada para tais funções” (Amélia Rodrigues, educadora e poetisa). “É uma bobagem, um absurdo, a mulher envolvida na política (…) era só o que faltava (…) A mulher deve e tem que apenas cuidar da educação dos filhos e de guardar o santuário da família (…) Prepare-se a mulher para ser boa mãe de família, o guia, o amparo e a confiança de seus filhos!” (Francisca Espínola de Ataíde, educadora). “Agita-se por toda parte a questão do sufrágio feminino, que traduz mais um pleito de homenagem à capacidade da mulher. (…) É um passo agigantado para a sua independência, na advocacia plena dos seus direitos mutilados, um resgate justificado à tirania secular (…) O absolutismo é deprimente, é humilhante, não gera a paz, ateia a revolta!” (dra. Praguer Fróes).

Morre, aos 68 anos de idade, José Marcelino de Souza, senador da República e ex-governador da Bahia. Natural de São Felipe, foi promotor e juiz municipal em Nazaré, depois deputado provincial. Participou da Assembleia Constituinte de 1891.

Morre outro ex-governador do estado, João Ferreira de Araújo Pinho, natural de Santo Amaro da Purificação e considerado, por todos, cidadão íntegro, já que nem os seus mais ferrenhos adversários sequer tentaram maculá-lo quando deixou o governo.

Registra-se a morte de mais um ex-governador, Severino dos Santos Vieira, filho da antiga Vila de Ribeira do Conde. Teve uma vida política ativa, exercendo, ainda, os cargos de deputado, senador e ministro da Viação no governo Campos Sales.

Proliferam os anúncios por meio de cartazes. A cidade do Salvador encontra- se abarrotada de propagandas com letras garrafais, já que “acredita- se que o anúncio é uma condição para quem quer vender”. As autoridades eclesiásticas proíbem a fixação de cartazes nas igrejas.

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